Que predicado esse que Abraão recebeu de Deus! Ele é o único homem que a Bíblia chama de “amigo de Deus”. Jesus também chamou alguns de amigos, como por exemplo Lázaro, mas também outros: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida pelos seus amigos. Vocês serão meus amigos, se fizerem o que eu ordeno” (Jo 15.13-14). Isso também nos inclui – aqueles que creem nele, o seguem e querem levar uma vida santificada.
Amizade tem a ver com serviço mútuo. Abraão, o amigo de Deus, nos demonstrou isso. Sua fé, que lhe foi creditada como justiça, manifestou-se de forma exemplar em seu serviço para o Senhor.
Certo dia, Abraão recebeu uma visita inesperada na hora mais quente do dia. Provavelmente ele estava sentado à sombra, descansando junto à entrada da sua tenda. “O Senhor apareceu a Abraão perto dos carvalhos de Manre, quando ele estava sentado à entrada da sua tenda, na hora mais quente do dia. Abraão ergueu os olhos e viu três homens em pé, a pouca distância” (Gn 18.1-2a).
Amizade tem a ver com serviço mútuo. Abraão, o amigo de Deus, nos demonstrou isso.
Aquela significativa visita foi a resposta de Deus à obediência de Abraão em fé. Dois desses homens devem ter sido anjos, e o terceiro ninguém menos do que Deus em forma humana, ou seja, visível. É bem possível que se tratasse do Filho de Deus, Jesus Cristo, antes da sua encarnação, como anjo do Senhor. Afinal, Jesus disse: “Eu afirmo que antes de Abraão nascer, Eu Sou!” (Jo 8.58).
Portanto, Abraão estava ali, face a face com Deus. Ele viu três homens desconhecidos num momento em que pouca gente estaria a caminho, já que era a hora mais quente do dia. “Quando os viu, saiu da entrada de sua tenda, correu ao encontro deles e curvou-se até o chão. Disse ele: ‘Meu Senhor, se mereço o seu favor, não passe pelo seu servo sem dar uma parada’” (Gn 18.2b-3).
Abraão serviu a esses homens e os alimentou (v. 2-8). Trouxe-lhes água para lavarem os pés, proveu-lhes um lugar à sombra para descansarem e mandou Sara assar pão para que pudessem fortalecer seus corações. Além disso, Abraão incumbiu um servo de preparar um bom novilho para eles. É significativo aqui que Abraão serviu pessoalmente ao seu Senhor (v. 3,8). Ele assume a condição de servo dos seus hóspedes. Isso também revela sua humildade. Ele se curvou, dando-lhes boas-vindas. Ele mesmo quis trazer-lhes o pão (v. 5). Portanto, não encarregou daquilo simplesmente os numerosos servos que o acompanhavam.
Imaginemos o cenário de forma bem concreta. Naquela ocasião, Abraão tinha 99 anos de idade. Mesmo assim, ele decidiu servir pessoalmente o seu Senhor. Ele correu imediatamente até os três visitantes quando os viu. – Você conhece algo semelhante? Você vai a um restaurante e não é atendido. Já ao entrar os atendentes olham ostensivamente em outra direção. Com Abraão ocorreu exatamente o contrário. Ele não vacilou quando se tratou de servir o seu Senhor! Ele foi diligente e se apressou (v. 2,6). Correu de um lado a outro e mobilizou tudo o que podia e tinha (v. 7). É tremenda essa atitude, e não esqueçamos que era a hora mais quente do dia.
“Tudo o que fizerem, façam de todo o coração, como para o Senhor, e não para os homens, sabendo que receberão do Senhor a recompensa da herança. É a Cristo, o Senhor, que vocês estão servindo.”
Quando então os visitantes receberam a refeição e estavam servidos, ele parou e manteve comunhão com eles (v. 8). A isso se acrescenta a generosidade de Abraão. O pão que Sara assou era da melhor farinha, e a carne era macia e boa – certamente o melhor dos novilhos, e foi preparada com manteiga e leite. Os hóspedes de Abraão não receberam pão amanhecido ou alguma outra coisa vencida ou de segunda linha.
Que diferença com os sacerdotes do povo de Deus nos tempos do profeta Malaquias! Eles ofereciam ao Senhor animais defeituosos e doentes, embora o mandamento de Deus fosse que os animais dos sacrifícios fossem sem defeito. Deus então disse que seria melhor fecharem o templo a celebrar cultos desse modo. O fogo do altar era inútil (cf. Ml 1). Abraão, por sua vez, fez exatamente como Paulo escreveu mais tarde: “Tudo o que fizerem, façam de todo o coração, como para o Senhor, e não para os homens, sabendo que receberão do Senhor a recompensa da herança. É a Cristo, o Senhor, que vocês estão servindo” (Cl 3.23-24).
O serviço de Abraão ao Senhor continua sendo exemplar para nós até hoje. Seu coração pertencia aos valores espirituais. Abraão, o amigo de Deus, era muito zeloso e dedicado ao nosso Senhor. E nós, como agimos? Também temos tanto zelo por Jesus, nosso amigo? Em sua disposição para servir, Abraão também reflete a imagem de Cristo. Justamente o nosso Senhor Jesus Cristo não veio para se deixar servir, mas para ele mesmo servir.
Continuando a leitura de Gênesis 18, encontramos a promessa do Senhor de que Sara teria um filho. Em seguida, os três homens continuaram sua caminhada em direção a Sodoma e Abraão os acompanhou. Quando se puseram a caminho para se dirigirem à cidade, o Senhor começou a falar das suas intenções: “Então o Senhor disse: ‘Esconderei de Abraão o que estou para fazer?’” (v. 17).
Essas palavras do nosso Senhor são mais uma demonstração da sua graça – Deus, cuja grandeza é insondável, cuja majestade brilha gloriosamente e cujo domínio dura por todas as gerações. E nós, humanos, somos como um sopro, nossos dias são como uma sombra que se desfaz. Sim, o que é o homem para que nosso Senhor se lembre dele? O que é o homem, para que lhe dê atenção? Ele cuida tanto de nós que em sua Palavra nos revela seus propósitos – algo que ele não precisaria fazer.
Quanta coisa ele nos mostra em sua Palavra! Ele nos informa o que sucederá no futuro à humanidade e a Israel. A Bíblia fala do fim dos tempos. Não se trata de mensagem agourenta, como muitas vezes se prega e se diz. É graça. É graça saber que o nosso Senhor retornará e o que acompanhará esse evento. Assim podemos alertar nossos contemporâneos. Foi o que ocorreu com Abraão, o amigo de Deus. “Esconderei de Abraão o que estou para fazer?”
Jesus Cristo diz: “Já não os chamo servos, porque o servo não sabe o que o seu senhor faz. Em vez disso, eu os tenho chamado amigos, porque tudo o que ouvi de meu Pai eu tornei conhecido a vocês” (Jo 15.15).
Inicialmente, Jesus revelou o plano divino aos seus discípulos. Este agora está registrado na Bíblia e pode ser conferido a qualquer momento. Assim, ele também o revelou a nós, e Deus também contou suas intenções a Abraão:
“Disse-lhe, pois, o Senhor: ‘As acusações contra Sodoma e Gomorra são tantas e o seu pecado é tão grave que descerei para ver se o que eles têm feito corresponde ao que tenho ouvido. Se não, eu saberei’. Os homens partiram dali e foram para Sodoma, mas Abraão permaneceu diante do Senhor. Abraão aproximou-se dele e disse: ‘Exterminarás o justo com o ímpio?’” (Gn 18.20-23).
Antes disso, Abraão havia servido ao Senhor. Correu de um lado a outro para que tudo fosse feito rapidamente. E agora Abraão estava parado, quieta e reverentemente, perante o Senhor e intercedeu de modo maravilhoso. E como intercedeu! William MacDonald escreve a respeito disso:
Após o Senhor revelar a Abraão seus planos de destruir Sodoma e enquanto os dois anjos caminhavam em direção à cidade, o patriarca iniciou uma intercessão em contagem regressiva: cinquenta [...] quarenta e cinco [...] quarenta [...] trinta [...] vinte [...] dez. O Senhor prometeu que não destruiria Sodoma caso encontrasse dez pessoas justas! A oração de Abraão é um exemplo extraordinário de intercessão eficaz. Seu pedido se baseava no caráter justo do Juiz de toda a terra (v. 25) e demonstrou a ousadia e a humildade profunda que somente o conhecimento íntimo de Deus pode oferecer. O Senhor só partiu depois que Abraão terminou sua intercessão (v. 33).[1]
Deus deu atenção a Abraão até o fim. Só depois de terminada a oração é que ele seguiu adiante. Nosso Senhor toma tempo para os seus filhos. Abraão apresentou-se como intercessor. Um intercessor precisa conhecer o Senhor pessoalmente e obedecer à sua vontade. Quando Abraão começou com sua oração, ele não ficou apenas parado – não, ele se aproximou ainda mais do Senhor. A proximidade com o nosso Deus é decisiva, porque então percebemos que efetivamente carregamos no coração os motivos de oração. Isso revigora nossa vida de oração.
Justamente quando intercedemos pelo nosso próximo é que nos tornamos particularmente semelhantes ao nosso Senhor.
Abraão sabia muito mais sobre o terrível futuro de Sodoma do que os habitantes da cidade, inclusive Ló. Só quem se orienta pelo Senhor e a sua Palavra reconhece os “mistérios” de Deus. E Abraão se preocupava com os justos – Ló e sua família. Essas pesadas cargas ele tinha de expor ao Senhor. Isso, é claro, nos lembra Jesus Cristo, nosso intercessor. De fato, é assim que o atual ministério do nosso Senhor, à direita do Pai nos céus, é a intercessão por todos os crentes. “Quem os condenará? Foi Cristo Jesus que morreu; e mais, que ressuscitou e está à direita de Deus, e também intercede por nós” (Rm 8.34).
Quantas vezes nos apresentamos ao Senhor em favor de outros? Será que intercedemos pelos que sofrem? Por crentes que lutam com o pecado? Justamente quando intercedemos pelo nosso próximo é que nos tornamos particularmente semelhantes ao nosso Senhor.
Abraão serviu ao Senhor quando este o visitou. Por meio da intercessão também vemos como ele serviu os crentes, ou seja, Ló e sua família. Além disso, Deus o escolhera para instruir seus filhos a se manterem no caminho do Senhor (Gn 18.19). Do mesmo modo, Abraão serviu sua família. Ele era um servo e levava uma vida dedicada. Os assuntos espirituais eram prioritários. É exatamente isso que caracteriza um amigo de Deus como Abraão.
Nota
- William MacDonald, Comentário Bíblico Popular – Antigo Testamento (São Paulo: Mundo Cristão, 2010), p. 30.
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